Somos
o resultado do nosso tempo. Vivemos numa época que busca encontrar-se. Este
nosso momento é chamado de Pós-Modernidade. O homem desta época é materialista
(valoriza o ter em detrimento do ser), hedonista (é o prazer pelo prazer, sem
compromisso ou amor), permissivo (vale tudo, desde que ele se sinta bem),
relativista (não existe absoluto), consumista (símbolo da sua liberdade, fator
gerador de crise econômica e ecológica) e niilista (um ser “livre”, aberto,
plural mas sem uma ética comum). Portanto, o homem pós-moderno é individualista
e solitário e na sua solidão sofre e é no seu sofrimento abre-se à porta da
humanização.
Numa
sociedade onde impera o “eu”, em que o outro não é visto e o que conta é o
prazer ninguém deseja olhar o sofrimento. Contudo, é interessante perceber que diante
da dor há um desejo de proximidade, anseia-se por ser notado e cuidado e quando
se percebe esta realidade e se deseja cuidar do outro, em primeiro lugar é
essencial entender que: “Cuidar do Ser é cuidar do outro que tem uma face – um
corpo que possui um semblante único.” É fundamental entender que o outro é
único e faz-se necessário vê-lo na sua unicidade.
Para
cuidar é preciso ver. É fundamental saber olhar. “A maneira de ver alguém pode mudar,
segundo a qualidade de nosso olhar.” Quem cuida precisa saber olhar, até porque
se não olhamos verdadeiramente, deixamos de ver e deixar de ver aquele que
cuidamos é matar antes mesmo do coração deixar de bater.
Quem
deseja cuidar precisa ver, pois o grande pedido do ser que é cuidado é: Olha
para mim! – Este pedido traz implicitamente o desejo de não desaparecer em
vida. É saber que o doente, a pessoa cuidada ainda existe e precisa ser tratada
com humanidade. É vê-la na sua inteireza.
Para
cuidar é preciso ver o ser humano e não apenas a sua mazela. É também deixar-se
ver. “É pelo nosso olhar que o doente pode ler a autenticidade da nossa
relação, e nós a dele. Os afetos e o nosso respeito são retribuídos por uma
mensagem de gratidão.”
Quem
cuida, precisa ouvir este clamor: Olha para mim! – Deve parar e ver a pessoa em
toda a sua inteireza. Ver muito mais do que as mazelas. Olhar para o ser e ver
muito além do sofrimento e se deixar invadir de compaixão ao ponto de remoer-se
interiormente. Se deixar invadir pelo outro. É ser esponja e assim, se
necessário for, “tomamos a dor do outro como se fora nossa. Mas como ela não
nos pertence, não vamos guardá-la, então é preciso espremer a esponja.”
Numa
sociedade impessoal, onde o que conta é o prazer, quem deseja cuidar, tem que
assumir as suas dores e ver o outro na sua essência e deixar-se ver como alguém
ferido também. Quem deseja cuidar tem que se tornar irmão no sofrimento. Vamos
fazer a caminhada juntos e dizendo eu estou aqui e a velar por ti.
Para
cuidar é preciso ver. Ver o próximo que sofre e vive suas dores. É fundamental
olhar para o outro como pessoa e pessoa com vida, apesar da sua debilidade. “A
pessoa que está connosco continua viva – corpo, mente, e espírito, e o
tratamento paliativo permite, para além da dor física, integrar os aspetos
psicológicos e espirituais, de modo a que o doente se sinta vivo até a hora de
sua partida – que pode ser iminente ou a longo prazo. Trata-se a doença que
afeta o corpo e quantas vezes se negligencia o espírito. Somos um todo, e esse
todo tem de viver em harmonia.”
Que
o nosso cuidar seja sempre de olhos abertos. Que vejamos sempre aquele que está
diante de nós. Que sigamos o exemplo do Cuidador dos cuidadores que sempre viu
os que sofriam e se enchia de compaixão.
Para cuidar é preciso
ver e ver o semelhante na tua integralidade.
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