Quando a morte chegar
Quando a morte chegar, há de
me encontrar de braços abertos. Talvez eu esteja fragilizado, desgastado pelo
tempo ou quem sabe acamado, não sei, mas uma coisa tenho certeza, ela vai
chegar e será aceita, até porque chegará na hora certa. Se assim é, devemos
voltar a falar sobre ela, pois o “progresso tendeu inevitavelmente a
marginalizar a morte.” (Grillo, 2016). Não desejo evitar falar sobre ela, até
porque a morte nos ensina a viver.
Quando a morte chegar, virá
declarando que eu vivi e quero que ela chegue quando eu estiver rodeado por
aqueles que me são importantes. Não quero que ela me encontre só. Walter Oswald
(Osswald, 2013) diz: “Morrer
sozinho, separado por cortinas dos companheiros de enfermaria, sem apoio nem
consolo não pode ser considerado resposta ao desejo de uma boa morte.”
Portanto, que quero que ela me encontre cercada por aqueles que eu amo e que me
amam. Quero que seja estilo Jacó, abençoando filhos e depois recolhendo-se e
partindo tranquilamente.
Quero viver muitos anos ainda,
mas vivo na perspectiva que a morte pode chegar hoje. Ela caminha comigo e se
tenho esta consciência procuro viver bem, desfrutando da vida, da companhia dos
amigos, família, valorizando as pequenas coisas que na verdade são as grandes e
mais importantes quando aprendemos a valorizar o ser e não o ter.
Sei que ela vai chegar e que
eu tenha a capacidade para entender o que disse Rubem Alves (Alves, 2000) :
“A proximidade da morte ilumina a vida. Aqueles que contemplam a morte nos
olhos vêem melhor, porque ela tem o poder de apagar do cenário tudo aquilo que
não é essencial. Os olhos dos vivos tocados pela morte são puros. Eles só vêem
aquilo que o amor tornou eterno.” Sendo assim, que tenhamos a morte à nossa
frente para que possamos valorizar o essencial, ver com pureza e que o amor
flua de nós eternizando cada momento.
Quando a morte chegar, que ela
nos encontre a celebrando a vida, pois ela também faz parte da vida. Que na sua
manifestação haja silêncio e reflexão. Aqueles que ficam manifestem sem medo
seus sentimentos e emoções e que haja um grupo de apoio, onde cada um tem a
capacidade de no silêncio ser companheiro de lágrimas do outro.
Amo viver e amo a minha vida e
por assim ser, tenho que refletir sobre a morte. “Mesmo que me ocupe com minha
morte e medite sobre ela, permanece o medo diante do desconhecido e ameaça que
a morte representa. Mas o medo não é o sentimento predominante quando penso em
minha morte. Pelo contrário, o sentimento principal é a gratidão por estar vivo
e a dedicação atenta a uma vida consciente.” (Grün, 2014) . Pensar na minha
morte me faz ser grato pela vida, me ensina a viver e a cultivar nas pessoas o
melhor que tenho para oferecer que é o amor, a amizade. Sim, quando penso na
minha morte, penso também o que deixarei para as pessoas e nas pessoas e eu
sigo o exemplo de Grün (Grün, 2014) : “Quero deixar
rastros do meu amor neste mundo, rastros que perdurem e indiquem um caminho,
que evoquem lembranças agradáveis, rastros a partir dos quais outros possam
prosseguir em sua busca.”
Quando a morte chegar, há de
me encontrar de braços abertos. Ela chegará como minha libertadora. Ela vai
chegar decretando o seu próprio fim, mas eu estarei celebrando a vida. Ela
chega sendo derrotada. Ela chega como prenúncio de um novo começo. Portanto,
quando a minha morte vier, eu a receberei com gratidão por tudo o que vivi e
dela me despedirei, pois a sua manifestação declara não o meu fim, até porque
estarei sendo revestido de incorruptibilidade. Utilizando o escrito de Paulo: “Mas
quando o que perece se revestir do que é imperecível, e o que é mortal se
revestir do que é imortal, então se cumprirá a palavra escrita: A morte foi
engolida pela vitória.” (1 Co 15.54). Portanto, o dia que ela se manifestar
para mim e em mim, partirei para o novo começo, estarei celebrando a vida e a
vida plena dizendo que valeu a pena.
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