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SAUDADE


Saudade

O coração está apertado. Há um sentimento de vazio dentro de mim. Nem a brisa leve que sopra consegue dissipar este aperto.
As pessoas estão a falar à minha volta, mas sinto-me só. Neste momento não consigo identificar-me com as pessoas. Tudo soa-me estranho, apesar da língua ser a mesma, de compreender tudo o que está a ser dito, porém, tudo soa-me como se fosse um idioma que não é o meu.
Este aperto causa uma dor terrível. O coração parece diminuir, mas no entanto, sei que a causa não é doença física. Não é problema de saúde. É saudade, pura e simplesmente saudade. Esta palavra só nossa, que ninguém consegue explicar, tomou conta de mim, sem que eu tivesse solicitado. Aliás, não sabia nem diagnosticar o que estava a se passar comigo até que, lembrei-me das palavras do salmista que diz: “Junto aos rios de Babilónia, ali nos assentamos e nos pusemos a chorar, recordando-nos de Sião. Nos salgueiros que há no meio dela penduramos as nossas harpas.” (Sl 137.1-2). É isto que está a acontecer comigo. Estou com saudade da minha terra.
Estou aqui, sentado não muito distante do Mondego e lembro-me do rio Amazonas, que eu carrego comigo no próprio nome. Tenho vontade de sair de barco, num passeio especial, para ver o encontro das águas, encantar-me com a beleza da criação e se Deus permitir, ainda de passagem ver o boto cor-de-rosa. Quem me dera hoje poder almoçar num flutuante, ter o privilégio de ter a bicharada toda ali à minha volta.
Quem me dera poder desfrutar de um bom tambaqui assado na brasa. Como eu queria beber um delicioso suco de cupuaçú, ou quem sabe de taperebá. Não importa, estou mesmo é com saudade da culinária cabocla.
Hoje eu queria estar com minha gente. Meu desejo era estar junto aos ínidos-luso-africanos. Essa é a ordem correcta. Queria estar junto a esta gente amigável, alegre e calorosa. Neste momento eu queria ouvir o sotaque cantado dos caboclos. Desejava ver o sorriso ligeiro daquela gente amorosa.
A brisa sopra, mas não traz consigo o cheiro da terra molhada. Não há as características da “Morada do Sol”. Minha terra é conhecida como Manaus que significa “Morada do Sol” e estou com saudade do brilho dessa gente.
O coração está miudinho, apertado e hoje, mesmo que eu soubesse cantar, o meu canto seria do silêncio, pois a saudade que aperta o coração projecta-me para as canções de Pereira, dos Raízes Caboclas e do meu amigo-irmão e irmão-amigo Alexandre Rocha. Quero ficar aqui sentado, na quietude deste dia, sem dizer nada a ninguém, apenas sentindo este aperto que, por mais que eu tente explicar, verbalizar, a verdade é que as palavras são poucas e não chegam.
É verdade, estou como o povo que sentou à beira rio e chorou a lembrar da sua terra. Estou a chorar por dentro com saudade da terra, da gente, das minhas raízes.Vou apenas ficar aqui, quieto, aguardando que este momento passe, mas ao mesmo tempo desfrutando dele, pois o mesmo fala-me da minha vida, da minha história.

Comentários

Falar de Marcos Amazonas não é fácil.

Seria necessário ter um oceano às mãos, pois sua alma tem um tamanho maior que o Atlântico.

Suas letras não tocam a inteligência apenas; elas tocam a alma. E a dele não é pequena!

Esse será um blog de muito sucesso!

Parabéns, amazonense!

Wagner Antonio de Araújo
Queridão,

Muito obrigado por suas palavras. Elas reflectem sua bondade e gentileza.

Um beijo no coração.

Marcos Amazonas
Miriam disse…
Esse texto mostra, para aqueles que ainda tinham dúvidas, o ser especial que você é. Graças a DEUS eu tenho a honra de ser sua irmã e ter compartilhado, com nossa amada e saudosa mãe, a alegria de te criar.
Nós caboclos, nos adaptamos em outros lugares, mas, vez por outra, temos saudades de nossas raizes.
Te amamos. Beijos
Verónica Vidal disse…
Sinto falta da minha terra, sinto falta da minha gente. Saber que não somos os únicos a sofrer de uma enfermidade, de certa forma é reconfortante, ainda que triste. O teu fado me toca a alma. A dança das tuas letras me faz chorar o coração. E, às vezes, só às vezes, o coração precisa chorar.

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