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Reencontro


A doença do meu pai alterou os meus planos. Esperava ir ao Brasil com toda a família, para que meus filhos tivessem a oportunidade de conviver com os primos e tios. Entretanto, isto não foi possível. Viajei sozinho e com o coração apertado, pois tinha a convicção plena que seria a última vez que estaria com meu pai.
Estava ansioso por chegar em Manaus. Minha querida cidade, a morada do sol. A cidade que eu trago guardada em meu coração. Fiquei surpreso com o seu desenvolvimento e crescimento. Vi que minha cidade mudou, já não a conheço. Tenho no meu imaginário a cidade dos meus tempos de adolescentes e início de juventude. Uma Manaus que não existe mais. Contudo, foi bom reencontrar-me com a minha terra, sentir o cheiro amazónico, poder saborear da culinária típica de lá.
Quando chegamos em Manaus, eu e minhas irmãs, fomos para casa do nosso irmão. Ficamos todos juntos novamente. Depois de quinze anos nos reencontramos e infelizmente, o motivo é idêntico, pois quinze atrás estivemos juntos por causa da doença de nossa mãe e seu falecimento. Agora estamos os quatro juntos novamente e o motivo é a doença de nosso pai. O motivo que nos reúne é doloroso, mas apesar da dor e tristeza, desfrutamos daqueles momentos com grande intensidade e gratidão a Deus pela oportunidade que Ele nos concedeu de estarmos ali naquele momento único de nossas vidas.
A história das nossas vidas nos separou fisicamente, mas não emocionalmente. Fomos criados unidos e permanecemos unidos e nada nem ninguém irá destruir esta união. Ainda lembro o último desejo de nossa mãe. Ela disse-nos: “- Eu vos criei unidos, permaneçam unidos.” E aqui estamos nós, unidos sem permitir que nada destrua esta união. Nem a distância consegue afectá-la. Mirza, a mais velha vive em Vitória com sua família. Miriam agora vive entre o Rio e Brasília por causa do trabalho. Thiago seu filho fica no Rio por causa do trabalho, mas o nosso cunhadão acompanha a esposa e vive de lá para cá. Moysés com os seus foram os que permaneceram em Manaus. Eu e os meus estamos em Portugal já faz onze anos, mas sempre unidos e ligados uns aos outros.
O nosso encontro foi marcado pelo reencontro com a nossa infância. Eu e minhas irmãs ficamos a dormir no mesmo quarto e aí lembramos da nossa infância e parte da adolescência em que os quatro dividiam o mesmo quarto. Estivemos a olhar para a história da nossa vida e do cuidado dos nossos pais para connosco. Nossos sobrinhos à nossa volta a admirar como nós brincávamos feito crianças. Parecia que o tempo não havia passado. Estávamos ali a viver e conviver. Juntos, nos reencontramos com à nossa história e com o nosso passado. Foi por causa disto, que eu pedi que fizéssemos uma foto. Ela era a cópia de uma foto que havíamos feito em nossa infância e adolescência. Aquela foto antiga foi tão importante que nunca esqueci daquele momento e ainda lembro-me a roupa que usava e a cor da mesma. Sendo assim, nós ficamos parados para fazer a foto e mostrar que o nosso reencontro é com a nossa história e com tudo aquilo que nos foi passado pelos nossos pais.
Eu desejava ter ido a Manaus com os meus filhos e esposa para juntos desfrutarmos de momentos alegres com meu pai, irmão e sobrinhos. Isto não foi possível, meus filhos e esposa ficaram em Coimbra. Os momentos que vivi com o meu pai foram numa UTI de hospital, mas tenho a certeza plena de que estes momentos de oração e conversa não foram em vão. Sei que ele não falou comigo, não pôde responder aos meus questionamentos, mas eu falei com ele, demonstrei-lhe afecto e amor e isto foi fundamental para mim.
Eu me reencontrei com o meu velho pai. Reencontrei-me com os meus irmãos e com a minha cidade. Na realidade eu reencontrei-me com a minha história, mas muito mais do que isso, eu reencontrei-me comigo mesmo. Vi que o que sou é fruto de um passado harmonioso e amoroso. Regressar a Manaus para ver o meu velho pai foi regressar ao começo. E como leio no Apocalipse que o fim é o recomeço de tudo, entendo que ao despedir-me de meu pai eu estou apenas a dizer até breve, pois caminho para o começo e para o verdadeiro reencontro com ele e com todos os nossos amados. Sendo assim, eu aguardo este reencontro glorioso.

Comentários

Anónimo disse…
Amado quando li seu comentario a respeito de sua vinda em manaus chegueia chorar de emoção e um pouco de tristeza pois não pude ve-lo e comprimenta-lo mais tenha uma certeza e guarde em seu coração eu oror por vc e sua Familia sempre que lembro e quando Deus manda eu orar por vc e pelos seus,como diz a musica .
"Se eu não encontar com vc outra vez mais quando eu chegar lá no céu te encontarei ,Amigo"
Miriam disse…
O que dizer de um texto como esse? Simplesmente que ele retrata o quanto é especial esse caboclo, meu irmão tão querido. Saudades de voc^.
bjs.

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